Nosso Castelo de Cartas

Nosso Castelo de Cartas

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Hipoteticamente sonhador.

Vinte anos depois, trigêmeos. Era véspera de natal, 24 de dezembro. A árvore cheia de presentes. Os garotos tinham sete anos, os três juntos mexiam nos pacotes tentando descobrir o que era, sem abrir. Ele abre a porta que dá pra sala bem rápido e sai correndo e gritando:
-Peguei vocês!
Sorrindo, ele agarra um dos trigêmeos enquanto os outros dois correm. Por enquanto, afinal, nos últimos dias ele vem tentando descobrir uma técnica para segurar os três de uma vez... As últimas seis tentativas falhas. Mas ele sempre foi um cara persistente...
Ela mostra seu rosto, saindo da cozinha, as mão sujas de brigadeiro, nunca consegue cozinhar sem comer antes de ficar pronta a receita, aprendeu isso com ele. O mesmo sorriso de sempre, e a boca melada de chocolate.
Dois dos trigêmeos estavam atrás do sofá, ele soltou o que se debatia em seus braços, tentando fugir. E foi ao encontro dela, a beijou, vinte anos depois, e era uma das poucas coisas que ele nunca tinha enjoado de fazer.
Os garotos ficavam rindo de trás do sofá, como se estivessem invisíveis...
Ele tomou a colher de brigadeiro das suas mãos, e lambeu, ela deu aqueles tapinhas de sempre nele, dizendo: -Não faz isso! - E sorrindo.
Ele abraçou ela forte, beijou seu rosto. Ela o abraçou também, já não o empurrava mais. Ele nunca gostou dos empurrões.
Ele ficou olhando nos seus olhos, só uns dez segundos, mas pareceu que foi pra sempre.
E saiu correndo com a colher nas mãos.
-Quem quer brigadeiro?
Os trigêmeos saíram correndo de trás do sofá. E a colher logo voou de sua mão.
Ela ria sozinha na cozinha enquanto pegava outra colher.
Ele entrou no quarto, foi na parte mais escondida do guarda-roupa, e pegou uma carta antiga, de vinte anos atrás. Endereçada a ele, aquela carta tinha percorrido dois mil kilomêtros, pra mudar duas vidas.
Faziam duas semanas desde a última vez que eles tinham se visto. Agora separados, já tinham chorado várias vezes, mas ela... Ela estava mal de verdade. Resolveu escrever uma carta, essa que ele tinha em mãos agora. Ela começava assim:
“Descobri que não consigo viver sem você.” E terminava com... “Eu quero ficar do teu lado agora, e para sempre.”
Ele podia ter guardado aquela carta,e aquela lembrança pra sempre.
Mas não, ele não o fez.
Ele ligou pra ela, e em uma semana ela estava no avião.
Ela não voltou mais, foi a escolha que ela fez.
E nunca se arrependeu.

Minerva

Eis que ela parte
Com seus olhos de sombra
Com seus olhos de lápis

Promessas eternas jogadas no chão
Tudo parece ter sido
Em vão

Pior que estar só
É sentir-se um ser a mais
Mais do que desnecessário
Sentir precisa
A tua ausência.
Pra que ele sinta tua falta...

E porque ele não sente a tua falta?

Ela parte de volta aos braços
Daqueles que a amam
De onde ela jamais
Deveria ter
Partido

Ficam para trás as lembranças
E as lágrimas
Já suficientemente
Derramadas
Seu mar petrificou
Solidificadas em seu rosto
Tomam a forma de uma máscara
Escura como a noite

Eis que ela parte
Com seus olhos de sombra
Com seus olhos de lápis

Parte a escuridão eterna
Parte sozinha,
Minerva
Seus olhos nunca mais serão os mesmos

Cobertos por uma
Máscara de lágrimas
Seu amor a deixou
Por nada.

Eis que ela parte
Com seus olhos de sombra
Com seus olhos de lápis

Ela que amou
Uma vez
Sente que só se ama
Uma vez

Sente suas lágrimas
Cobrindo o rosto
Para sempre
Tornando-se uma máscara

...

A última carta a seu amor escrita.

No cantinho da página
“Da sua eterna Minerva”

...

Dar-se a impressão
De que nada mudou.
Mas é só impressão...

Eis que ela parte
Com seus olhos de sombra
Com seus olhos de lápis

Eis que ela parte
Sem nada

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Uma carta a 10 de julho de 2008 - 2ª Parte

Engraçado que a vida não parece se enganar se tomarmos como pressupostos alguns fatos, fatídicos ou não. Engraçado é como o dia aparentava não se importar como o que eu pensava sobre isso também. Isso supôs , logo ao levantar. Aquele momento de luta contra o eu interior que te fala alto e com autoridade:-Você estará sempre com o cansaço que quero que esteja e tudo pode esperar mais um dez minutos. Minutos estes suficientes para que eu não voltasse a ouvir o despertador (que por algum detalhe sórdido do destino era a minha televisão). Dormi. Acordei com as palavras e suor no meu corpo. Elas diziam Marina.
Levantei ainda sobre forte luta. E mesmo dormindo demais parecia que tinha ficado ainda mais cansado que a primeira vez. Tinha levado uma surra. Às vezes a vida me bate forte demais. Levante me dizendo que aquele seria mais um dia cansativo e coisas do tipo. Não fui à escola.
Tempos fáceis esses de criança. Assim pensam todos. Para mim era viver num drama. A escola parecia um velho internato de aberrações que por mais que fossem assustadoras para mim, eu como meus super poderes que julgava ter, ainda conseguia assustá-los ainda mais.
Ninguém gostava de mim. Assim pensava. Eu não gostava de ninguém. Isto estava prestes a mudar.
Decidi marcar algo, qualquer coisa que me livrasse daquele momento e daquele lugar. Que me levasse pra longe. Que me deixasse disperso por um tempo. E desperto. Dormir eu não conseguiria mais. E tem horas que até os jogos conseguiam me cansar de uma maneira que me assustava às vezes. Sei lá. A vida não tinha mais graça.
Liguei para o Alberto. Disse o de sempre. Tédio? Perguntei. Tédio. Respondeu. Ele também era bem previsível assim como eu fui. Talvez seja. Você consegue me responder isso Amanda? Lembro daquela frase de uma autora que dizia que perdeu sua face em um espelho. Devia ser um espelho desses bem velhos que ela nem lembra onde deixou para ir procurar.
Talvez me sinta assim. Perdi meu coração naquele dia. E isso foi só o começo de uma terrível história de perdição. Nós começamos a perder e parece um esporte tão divertido. Esquecemos de parar. Esquecemos muitas coisas no caminho, Amanda.
Saímos.
Cansados de tudo e todos. Fomos em lugares encontrar tudo e todos.
Cinema? Sim, parece uma boa. O que acha? Ah! Meu amigo... Não acho nada... Conversei com um rapaz novo da turma ontem. E aí? Ele parecia mais velho. Pensou que ia te entender? Pensei. E...? E ele parece gostar de tudo que a maioria pré-adolescente gosta... Ele me dá nojo agora. Não tente... Nunca mais... Talvez alguém de seus 45 anos? Alberto... Um dia você vai entender que nascemos mortos.
Não eram frases de crianças de 15 anos.
Aumente o drama Dj. Alguém dizia isso?
Chegamos. Lugar comentado. Todos fugiam da escola para lá. Todos apareciam depois. E nós fomos, mesmo não querendo encontrar ninguém (oh! Quão errado eu estava... Eu queria encontrar a Marina... Mesmo sem nem conhecê-la). Algumas pessoas falavam conosco. Outras não. Outras esbarravam. Não começamos nenhuma briga. Você lembra desse meu jeito de não entrar em certas coisas que sei que vou perder não é mesmo?
Continuamos. A fila crescia. Tédio. Tédio. Tédio.
Ou o quê?
Foi num pulo. Foi num momento. Foi em um lançar de olhar.
Eu a vi passar por mim.
Seu nome? Marina, belo como as ondas do mar e os versos que cantaram por Mariana. E como todas as outras muitas, uma ou duas garotas que conheci na vida. Eu jurei que ela seria minha. Frase obsessiva, possessiva, e sejamos sinceros, infantil.
Mas era uma promessa.
Não sabia seu nome até essa hora.
Quem é ela? Quem é ela, Alberto? Ela quem? A menina do vestido amarelo! Ok. Qual delas? Aquela... Com a flor no cabelo...a mais linda de todas... Ela? Não seja idiota. Ela nunca vai te olhar. Seu nome é Marina. Ela nunca olha para ninguém. É um desafio para qualquer um.
Aquela palavra.
Eu queria ver seus lábios se movendo naquele momento dizendo:-Desafio. Que palavra aterradoramente linda.
Eu disse a Alberto.
Adoro Desafios.
E parti em sua direção.
Neste momento eu perdi meu coração...

(Ás de Espadas)

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Sonhando acordado

Ele atende o telefone.
- Quem é?
- Você já sabe.
Ele faz cara de... “Você de novo”.
E escuta o mesmo “blá blá blá” de sempre.
É como uma caverna escura e sombria.
Onde não se vê um palmo a frente do nariz.
Chove.
É você está deitado na lama.
A água faz esforço pra fechar teus olhos.
Você os mantém abertos.
Sem saber porquê.
Mas os mantém abertos.
O som do vento, misturado com os pingos d’água caindo.
Lembra-te um solo de piano.
E te faltam até palavras, pra dizer qualquer coisa.
Numa tentativa desesperada, você pega um papel, coloca numa garrafa de vidro, e joga no mar.
O papel está em branco.
Mas ainda te resta a esperança de que alguém escreva algo nele, e jogue de volta no mar. E você o encontre.
É tipo, uma chance em 6 bilhões.
Levante-se, e continue correndo.
A chuva não vai parar.
Mas, simplesmente continue correndo.
Run Forrest, Run.
Keep running.
Chegue a qualquer lugar.
Ele acorda.
Nada é apenas um sonho
Tudo é apenas o mesmo erro.
Cometido mais umas muitas vezes.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Uma carta a 10 de julho de 2008.

Querida Amanda, me desculpe, eu não vou voltar. Mande lembranças a Jeff, um grande abraço a Kadu.
Deixe-me contá-la. Era um simples, 10 de Julho do ano de 2008, o dia fatídico, tudo mudou, os crepúsculos e as luas cheias nunca mais foram as mesmas.
Primeiro, eu me apaixonei. Não foi a primeira vez, e você sabe disso. Mas você entende que isso por si só não muda nada. Segundo, eu a amava, ela também amava... mas era o Lucas.
Normal até agora, mas isso tudo ainda não muda nada. Era apenas mais um caso comum de triângulo amoroso, e uma história super sem graça de três adolescentes de 15 anos que mal merecia ser escrita no diário dela.
Seu nome? Marina, belo como as ondas do mar e os versos que cantaram por Mariana. E como todas as outras muitas, uma ou duas garotas que conheci na vida. Eu jurei que ela seria minha. Frase obsessiva, possessiva, e sejamos sinceros, infantil.
Hoje, já faz dez anos. E você deve estar se perguntando agora, porque eu não vou voltar. E que merda isso tem a ver com 10 de julho de 2008.
Eu mudei, sim, foi isso. E não foi hoje, não foi ontem. Foi naquele dia fatídico. E não foi você, nem eu. Foi ela, Marina. Um vestido amarelo, uma flor que eu não sei o nome na cabeça. Cabelos ao vento, câmera em “slow” eu ainda lembro dela dessa forma.
...
10 de julho de 2008.
Eu acordei, e o sol forte me dizia que aquele ia ser mais um dia do tipo “igual a todos os outros”. Por mais incrível que pareça, ele estava enganado.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Coincidências sem destino.

Estaciono meu carro na frente do seu. Velho amigo, dos tempos de infância, parado na pista. Quase não o reconheci. Seu carro, vermelho, nem tão novo nem velho. Pneu furado, ele estava sem estepe. Eu desci do meu carro, aquele abraço... Conversa vai, conversa vem, estávamos trocando o seu pneu, eu tinha um estepe, serviu. Foi então que me lembrei daquele dia... E o perguntei:

- Cara... Tanto tempo depois e nós estamos aqui, conversando, brincando, como os velhos amigos que éramos! Lembra? Por que nós paramos de se falar como antes? Por que temos de conversar só quando acontecem coincidências com essa?

- É complicado não é? A vida segue cada um toma seu rumo. As pessoas passam pela vida da gente, e anos mais tarde... Foi tudo apenas uma lembrança. Naquela época, ninguém pensa nisso. Já te falaram que só notamos as flores da primavera, no inverno?

- Pra falar a verdade, não! Mas acho que é assim que tem de ser, temos de lembrar das flores no inverno e sentir saudade delas, caso contrário, digo se as notasse na primavera, eu teria zelo, colocaria todas as flores em caixas de vidro, e elas ficariam lá intactas, lindas e elegantes, por outro lado eu nunca sentiria o aroma doce que vem delas.

- Talvez você tenha razão velho amigo. Flores não foram feitas pra serem admiradas pelo resto da vida. Elas brotam, desabrocham... E... Murcham. Por mais que não se queira às vezes, as coisas são naturalmente assim. Elas simplesmente... Terminam. É no final, tudo passa.

Mas é sempre bom encontrar um velho amigo nas esquinas de qualquer lugar.

(Por Oito e Valete de Espadas)