Nosso Castelo de Cartas

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terça-feira, 31 de maio de 2016

Dois copos, um conto - O menino que não acreditou (Parte 3)

          Se existe algo que eu aprendi, e que quero que você saiba, isso com certeza é: TUDO SEMPRE PODE PIORAR. Acredite em mim. Na maioria das vezes piora. E muito. Eu já estava com a cabeça doendo, com fome e pensando que nunca me livraria do exército do mal. Os terríveis meninos maiores e destruidores dos sonhos infantis. Eu nem ia me importar com tudo o que aconteceu, mas inevitavelmente uma grande quase-roda se formou ao meu redor. Eu fiquei assustado demais pra pensar. Assustado demais pra correr. No meio da galera que veio assistir a “briga”, ela estava com um olhar assustado. Parecia preocupada.
            Lá no canto estava a Brisa. No canto do meu olhar e em uma parte um pouco distante da roda. Eu queria dizer “oi”. Queria dizer “não fique assim”. Mas estava encrencado demais pra se preocupar com outra pessoa que não fosse eu mesmo e minha “briga”. Primeiro: por briga se entende algo que se disputa. Uma luta com dois lados. Aqui isso não era nada de “justiça”. Eu seria surrado sem nem a menor chance de revidar. Sempre assim. O pior seria isso tudo acontecer na frente da Brisa. Eu não queria que ela visse. Não queria. Dessa vez eu iria lutar. Lutar e vencer. Hoje seria diferente.
            Fechei meus punhos. A adrenalina corria no meu sangue. Principalmente depois da pancada que levei na cabeça. Comecei naquele instante a acreditar em mim. Eu podia. Podia e iria. Brisa iria se orgulhar de mim. Eu já me imaginava chegando depois da briga com um pequeno arranhão no supercílio. Ela viria toda preocupada e carinhosa, ficaria com lágrimas nos olhos, mas eu diria que aquilo não era nada. Iria sorrir e tocar seu rosto. Dizer que tudo o que eu fazia era por ela. Impossível que ela não se apaixone de volta. Impossível. O filme passou. Era hora da verdade.
            Fechei os punhos. Definitivamente, fechei os punhos. Um dos meninos maiores estava à frente de outros três integrantes do terrível exército do mal. Ele viu meu punho fechado e riu. Será possível que o pivete quer brigar. Ele perguntava. Era minha deixa. Olhei para Brisa. Sorri para acalmá-la e me inspirar. Corri em direção ao maior deles com toda a força que tinha concentrada no punho direito. Se você vai entrar numa briga, comece-a. Eu já sabia que iria ser difícil, mas dessa vez eu iria vencer. Acertei o soco em cheio bem na cara do primeiro deles.
Senti meu punho entrando aos poucos no rosto dele. Era poder. Aquela sensação era o poder. Meu coração elétrico. Palpitava de emoção. Ele balançou com o murro e eu percebi minha chance. Fechei o outro punho. Preparei o segundo soco. Dessa vez iria derrubá-lo. Eu sorria e já imaginava o medo infantil no coração das trevas do enorme garoto. Usei toda a força que tinha e avancei mais um passo, levantava o super-mega-ultra soco definitivo quando senti algo na minha orelha. Estranhei a princípio, mas em poucos segundos entendi. Era uma mão. Uma mão grande e pesada que quase deslocou minha cabeça da órbita que eu estava acostumado. Senti só algo quente escorrendo pelo meu pescoço. Quando olhei pra frente não vi mais muita coisa. Algumas mãos e pés me acertavam, mas eu só sentia tudo quente. Nada de dor. Tentei enxergar a Brisa, mas tudo estava muito escuro. Muito escuro.

Eu já disse: tudo sempre pode piorar. E piorava...

terça-feira, 10 de maio de 2016

Reescrevendo (Fev/2010) - Uma carta a 10 de julho de 2008

Querida Amanda, me desculpe, eu não vou voltar. Mande lembranças ao Jeff e um grande abraço para Cadu. 
Deixe-me contá-la. Era um simples 10 de julho do ano de 2008. O dia fatídico. Tudo mudou. Os crepúsculos e as luas cheias nunca mais foram as mesmas.
Primeiro, eu me apaixonei. Não foi a primeira vez e você sabe disso. Mas você entende que isso por si só não muda nada. Segundo, eu a amava. Ela também amava... Mas era o Lucas.
Normal até agora. Isso tudo ainda não muda nada.
Era apenas mais um caso comum de triângulo amoroso e uma história super sem graça de três adolescentes de 15 anos que mal merecia ser escrita no diário dela. Seu nome? Marina. Belo como as ondas do mar e os versos que cantaram por Mariana. E como todas as outras muitas (uma ou duas) garotas que conheci na vida. Eu jurei que ela seria minha. Frase obsessiva, possessiva e, sejamos sinceros... infantil. Hoje, já faz dez anos. E você deve estar se perguntando agora por que eu não vou voltar. E que merda isso tem a ver com 10 de julho de 2008.
Eu mudei. Sim, foi isso. E não foi hoje, não foi ontem. Foi naquele dia fatídico. E não foi você, nem eu. Foi ela: Marina. Um vestido amarelo, uma flor que eu não sei o nome na cabeça. Cabelos ao vento, câmera em slow motion... Eu ainda lembro-me dela dessa forma.
10 de julho de 2008.
Eu acordei e o sol forte me dizia que aquele ia ser mais um dia do tipo “igual a todos os outros”. Por mais incrível que pareça, estava enganado.
Engraçado que a vida não parece se enganar se tomarmos como pressupostos alguns fatos, fatídicos ou não. Engraçado é como o dia aparentava não se importar com o que eu pensava sobre isso também. Isso supus, logo ao levantar. Aquele momento de luta contra o eu interior que te fala alto e com autoridade: “você estará sempre com o cansaço que quero que esteja e tudo pode esperar mais uns dez minutos”. Minutos estes suficientes para que eu não voltasse a ouvir o despertador (que por algum detalhe sórdido do destino era a minha televisão). Dormi. Acordei com as palavras e suor no meu corpo.
Elas diziam “Marina”.
Levantei ainda sob forte luta. E, mesmo dormindo demais, parecia que tinha ficado ainda mais cansado que a primeira vez. Tinha levado uma surra. Às vezes a vida me bate forte demais. Levantei dizendo-me que aquele seria mais um dia cansativo e coisas do tipo.
Não fui à escola. Tempos fáceis esses de criança. Assim pensam todos. Para mim era viver num drama. A escola parecia um velho internato de aberrações que, por mais que fossem assustadoras para mim, eu, com os super-poderes que julgava ter, conseguia assustá-las ainda mais. Ninguém gostava de mim. Assim eu pensava. Eu não gostava de ninguém. Isso estava prestes a mudar.
Decidi marcar algo, qualquer coisa que me livrasse daquele momento e daquele lugar. Que me levasse para longe. Que me deixasse disperso por um tempo. E desperto. Dormir eu não conseguiria mais. E tem horas que até os jogos conseguiam me cansar de uma maneira que me assustava às vezes. Sei lá. A vida não tinha mais graça.
Liguei para o Alberto. Disse o de sempre. “Tédio?” – perguntei. “Tédio” – respondeu. Ele também era bem previsível, assim como eu fui. Talvez seja. Você consegue me responder isso, Amanda? Lembro daquela frase de uma autora que dizia que perdeu sua face em um espelho. Devia ser um espelho desses bem velhos que ela nem lembra onde deixou para ir procurar.
Talvez eu me sinta assim. Perdi meu coração naquele dia. E isso foi só o começo de uma terrível história de perdição. Nós começamos a perder e parece um esporte tão divertido. Esquecemos de parar. Esquecemos muitas coisas no caminho, Amanda.
Saímos. Cansados de tudo e todos. Fomos a lugares encontrar tudo e todos. Cinema? Sim, parece uma boa. O que acha? Ah! Meu amigo... Não acho nada... Conversei com um rapaz novo da turma ontem. E aí? Ele parecia mais velho. Pensou que ia te entender? Pensei. E...? E ele parece gostar de tudo que a maioria pré-adolescente gosta... Ele me dá nojo agora. Não tente... Nunca mais... Talvez alguém de seus 45 anos? Alberto... Um dia você vai entender que nascemos mortos.
Não eram frases de crianças de 15 anos. 
Aumente o drama, DJ. Alguém dizia isso? Chegamos. Lugar comentado. Todos fugiam da escola para lá. Todos apareciam depois. E nós fomos, mesmo não querendo encontrar ninguém (Oh! Quão errado eu estava... Eu queria encontrar Marina... Mesmo sem nem conhecê-la). Algumas pessoas falavam conosco. Outras não. Outras esbarravam. Não começamos nenhuma briga. Você lembra desse meu jeito de não entrar em certas coisas que sei que vou perder, não é mesmo?
Continuamos. A fila crescia. Tédio. Tédio. Tédio. Ou o quê? Foi num pulo. Foi num momento. Foi num lançar de olhar. Eu a vi passar por mim. Seu nome?
Marina, bela como as ondas do mar e os versos que cantaram por Mariana. E como todas as outras muitas (uma ou duas) garotas que conheci na vida, jurei que ela seria minha. Frase obsessiva, possessiva, e, sejamos sinceros... Infantil.
Mas era uma promessa.
Não sabia seu nome até essa hora. Quem é ela? Quem é ela, Alberto? Ela quem? A menina do vestido amarelo! Ok. Qual delas? Aquela... Com a flor no cabelo... A mais linda de todas... Ela? Não seja idiota. Ela nunca vai te olhar. Seu nome é Marina. Ela nunca olha para ninguém. É um desafio para qualquer um.
Aquela palavra.
Eu podia ver seus lábios se movendo naquele momento dizendo:
- Desafio.
Que palavra aterradoramente linda. Eu disse a Alberto. Adoro desafios. E parti em sua direção. Neste momento, eu perdi meu coração...
“Adoro desafios” – eu comecei aquela noite dizendo. Pergunte a Alberto qual foi a minha última frase naquela noite: “Alberto, eu odeio desafios!”.
É engraçado lembrar como as opiniões de um adolescente mudam em uma noite. Na verdade... As opiniões de qualquer pessoa muitas vezes mudam na mesma noite.
Hoje? Ah... Amanda, você sabe que eu adoro desafios. Aquelas minhas palavras no fim da noite foram totalmente influenciadas. Por quem?
Marina.
Eram 23h54, 10 de julho de 2008. 
Três minutos antes de Marina passar por mim. Eu ainda lembro como se fosse há cinco segundos...
Eu virei para Alberto e disse:
- Já é quase dia 11.
E ele me respondeu com aquela cara de “o que você disse?” que só o Alberto sabe fazer.
- Ainda é dia nove, quase dia 10. Tá querendo adiantar um dia de vida?
E eu respondi a Alberto com aquela cara de “sério?” que só eu sei fazer.
- Um dia a mais, um dia a menos... Que diferença faria?
Ainda era dia 9, pelo menos por mais alguns minutos. 
Às 23h57, eu cheguei à conclusão de que deveria ir embora; afinal, faziam apenas três minutos que eu havia olhado o relógio e pareciam trinta.
Então alguém apertou o slow motion e trinta segundos depois eu dei um tapinha no ombro de Alberto e parti em direção àquela flor... Qual era mesmo o nome daquela flor no cabelo dela?
Meia noite, 10 de julho de 2008. Eu chamei a atenção dela, tentei segurar sua mão. Obviamente, ela puxou a mão bem rápido, eu já previa isso. Ela virou o rosto para mim. E me encarou nos olhos, durante... sei lá quantos segundos foram. Mas aqueles segundos me fizeram acreditar, mais ainda, que ela havia nascido para mim.
Eu olhei para ela e disse:
- Teus olhos são tão lindos.
E ela virou para mim e disse:
- Todo mundo me diz isso.
Meia noite e cinco minutos de 10 de julho de 2008. Marina me deu as costas e partiu. Meia noite e meia, eu pilotava a moto; 15 anos e eu não tinha carteira. Claro. Mas meu pai liberava às vezes. Era só ir pelos caminhos certos, nunca dei de cara com polícia. Alberto atrás, ele não colocou nenhuma objeção em ir para casa naquela hora.
Nem se colocasse. Não havia nada a dizer. Não havia nada a fazer. Partir. A palavra ecoava. Vazia. Sem vontade. Partir. E parti, mesmo sentindo que o mais importante eu deixava.
Continuamos a nossa viagem de moto. Insegura na visão de alguns. O que quer que seja na visão de outros. Só palavras e julgamentos e eu não queria me julgar naquele momento. Sabe por quê? Os próximos minutos foram daqueles que te marcam. Marcam a sua vida inteira.
Chego até a sentir ecoar 10 anos depois quando se escreve uma carta a uma grande amiga. Amanda, tento te dizer tudo, porque sei que Alberto não entendeu. Ele estava muito à frente de tudo. Acho que não entendia sentimentos infantis. Desses bobos que a gente se entrega e pensa: “tudo pode acabar agora... Nada importa... Pois sou feliz e tudo eu tenho. O mundo é meu. E todo sentimento é reflexo de mim. Ecoando no universo”.
Eu olho no retrovisor, vem outra moto a toda velocidade, e me ultrapassa. Tão certo quanto tudo o mais... A minha moto nunca acompanharia aquela. Na frente, um cara alto e forte. Atrás, uma garota de vestido amarelo.
O vento batia forte no vestido. E o mundo girou mais lentamente, embora nenhum físico ou astrônomo reconhecido tenha percebido. Mas naquele instante eu sabia que algo iria acontecer.
A ultrapassagem foi pela direita adicionada de um corte imprudente para a esquerda, sem sinal nem nada. Ultrapassagem numa curva... Bem esperto, não? E sim. Era uma curva. Daquelas que não se pode ver se vem outro carro na outra mão. As chances de vir, é claro... Mínimas... Ou você achou que viria, Amanda?
Esperta você... Pois é... Vinha. Um caminhão enorme. O caminhão passou por cima e não sobrou moto, nem cara alto, nem menina do vestido amarelo. Eu fiz a curva. Tranquilo.
Marina está morta.
A moto reduziu a velocidade gradativamente... Até que Alberto bate em meu ombro dizendo:
- Tá acordado, cara?
Eu não sei o que passava diante dos meus olhos. Vez ou outra eu me perdia no que pensava. Perdia a linha enquanto via qualquer coisa. Talvez o automatismo no dirigir, pois mesmo jovem já era habitual.
Mas era só para me enganar. Faltava ela, Amanda. Ela era a pior dentre todos os seres que conheci. Sem pena ou dó de minha pobre existência, ela roubou cada um dos meus dias ao roubar meu coração. Sabe o pior? Eu a agradecia... Pensava em toda sua pureza impura que me corrompia. Eu ansiava por mais um segundo com ela. Diria as palavras certas e a faria me amar. Como nunca amou.
Como nunca amei.
Por que nunca amei, Amanda? Por que nunca pude me entregar a ninguém como a ela? E naquela moto o homem com ela cheirava a competição. Que eu perdi. Eu sempre perco antes de concorrer. Foi sempre assim. Eu pisco os olhos e volto à realidade. E percebo que toda aquela cena que eu vi em minha cabeça foi uma tentativa de me fazer acreditar que Marina estava morta para mim.
Bom, foi uma tentativa bem inútil. 
Ainda restavam 23 horas e 30 minutos desse 10 de julho de 2008. Que eu pensei que já tivesse acabado. O dia 10 continuava. Eu queria ver Marina uma vez mais. Adriano uma vez me disse:
- Coração é terra que ninguém pisa...
Eu nunca o ouvi.
Corri. E fui me entregar...
Queria que aquele dia 10 nunca mais terminasse. Eu pensava: “Assim Marina estará sempre em mim”. Eu adormeci, Marina permaneceu até em meus sonhos. Acordei cedo: eram 8h de 10 de julho de 2008. Ao sair do quarto, notei as caixas de papelão na sala. Havíamos nos mudado há pouquíssimo tempo. Por causa do emprego do meu pai, passávamos, às vezes, apenas um mês na mesma cidade. Eu nunca entendi aquilo. No começo, eu não gostava, porém me acostumei. Estranho. Eu não lembrava daquelas caixas de papelão ali no dia anterior. Pensei que já havíamos terminado toda a mudança.
Eu estava só em casa, meus pais haviam saído cedo. Tomei café, resolvi ir à praia. Eu gostava daquela cidade que tinha uma praia tão perto de casa. Mas eu estava ali há tão pouco tempo, que nem lembrava o nome da cidade direito; às vezes eu a esquecia ou confundia com alguma outra onde eu havia morado.
Cheguei à praia às 8h30. Sabe quem estava lá?
Sim. Marina. O que aconteceu? Eu me lembro da primeira frase que falei, desculpa para puxar papo, para sentar do lado dela.
- O mar é mesmo muito lindo.
Alguns segundos depois, eu pensei: “Já sei o que ela vai dizer: ‘Todo mundo me diz isso’”.
Mas ela não disse. Ela disse:
- Verdade. 
E sorriu.
Ah, eu não vou entrar em detalhes... Eu sentei ao lado dela, disse alguma coisa, ela respondeu alguma outra coisa. Conversa vai, conversa vem, eu acho que ela nem lembrava que eu havia falado com ela na noite anterior. Também... quantos garotos será que falaram com ela na noite anterior? Não me admira ela não lembrar o meu rosto. Aliás, melhor assim. Mas naquele dia... Ah, naquele dia eu era o único... Eu não lembro o que eu disse dessa vez. Mas ela sorriu de novo. Eu não consigo esquecer aquele sorriso.
Eu a beijei.
Ela me beijou.
Marina.
Slow motion.
E naquele momento eu percebi que toda a minha vida tinha valido a pena. Que eu poderia morrer naquele momento, sem me arrepender de nada do que havia feito até então. Tudo por aquele momento.
Era hora do almoço e nos despedimos. Ela sorriu, foi almoçar em casa e eu também. Combinamos de nos encontrarmos no dia seguinte, naquele mesmo local, naquele mesmo horário. Eu cheguei em casa, cara de “garoto mais feliz do mundo”. Havia bem mais caixas em casa. Estranho.
Minha mãe não fez almoço: mais estranho ainda. Havia umas marmitas na mesa. Ela me viu e me contou algo perfeitamente normal – eu já estava acostumado.
- Filho, vamos nos mudar hoje ainda. Você sabe como é o trabalho do seu pai... Coma uma marmita. Eu não tive tempo de fazer almoço. Arrume suas coisas logo.
Marina. Ecoava em minha cabeça.
Então, eu acordei pra realidade.
- Mãe, vamos nos mudar hoje?
- Sim. Vamos, filho.
Eu corri. Minha mãe gritou algo. Eu não escutei. Eu corri pra praia.
Ela não estava lá.
Eu perguntei às pessoas ao redor, ninguém sabia, ninguém tinha visto. Eu corri desesperado por todos os lugares da cidade. Nada. Eram 18h, 10 de julho de 2008.
Voltei para casa me arrastando. Nenhum sinal de Marina. Levei uma bronca horrível dos meus pais.  Eu não lembro nada do que eles disseram. A minha cabeça ia explodir. Ela não conseguia processar a informação de que eu nunca mais veria Marina.
Poucas horas depois, entrei no carro, fomos embora. Nem lembro em qual cidade eu morei depois dessa, mas foi pouco tempo também. Nem me lembro de mais nada.
Depois desse dia, eu vivi uns anos sem viver. Eu esqueci completamente o nome da cidade onde eu havia conhecido Marina. Na verdade, eu me esforcei para esquecer. Eu sabia que eu não podia voltar lá. No final, eu queira que fosse apenas uma lembrança. Um sonho.
Marina... Ela não existiu de verdade. Foi só um sonho.
Não foi?
O tempo passou. Ele não apaga as feridas, mas cicatriza. E eu consegui levar uma vida normal. Eu conheci você, Amanda... Mas sabe o que aconteceu?
Ontem eu precisei viajar. Pois é, acabei me acostumando e fui trabalhar com meu pai. Graças a Deus, hoje em dia eu preciso viajar bem menos que ele naquela época.
Hoje estou aqui, na praia. São 8h20. Estou te escrevendo essa carta, explicando por que eu não vou voltar. Por causa de 10 de julho de 2008. Porque ontem eu resolvi dar um pulinho na praia dessa cidade.
Eu lembrei. Foi aqui. Eu tenho certeza. Foi aqui onde eu sonhei com Marina.
10 de Julho de 2008.
Não me pergunte como, mas eu sabia. Eu pedi demissão ontem mesmo. E hoje de manhã resolvi te escrever essa carta. “Querida Amanda, me desculpe, eu não vou voltar. Mande lembranças a Jeff, um grande abraço para Cadu. Deixe-me contá-la. Era um simples 10 de julho do ano de 2008. O dia fatídico. Tudo mudou. Os crepúsculos e as luas cheias nunca mais foram as mesmas”.
Eu vou ficar por aqui. Eu vou arriscar tornar aquele sonho realidade. Por menor que sejam as chances. Eu sei, eu tenho certeza. Eu vou encontrar Marina.
Terminei. Guardo a carta no envelope. Ponho dentro da minha mochila e olho pro mar. Tem uma garota olhando pro mar também, sentada na areia. Tem uma flor no cabelo dela... Qual era mesmo o nome dessa flor? Eu sentei do lado dela. Precisava dizer algo para puxar papo.

- O mar é mesmo muito lindo.