Nosso Castelo de Cartas

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segunda-feira, 8 de maio de 2017

Meu último desvario

Acordei com um sorriso no rosto, ela do meu lado ainda dormindo. Passei uns minutos admirando ela na cama, eu diria, tão apaixonado quanto fui desde que a conheci tantos anos atrás, mas era mentira, na verdade, cada dia que passava eu a amava mais.
Mas foi rápido, logo fomos atacados na cama. Um ser saltou sobre mim e se jogou entre a gente para nos acordar, “Papai! Papai!” O pequenino gritou. “Vem ver o que eu fiz!”  Ela reagiu com uma careta de quem foi acordada cedo demais, engraçado, as coisas mudam, eu que costumava reclamar de acordar cedo, ela falou ainda com os olhos fechados “Vão lá, vocês dois... Que eu quero dormir”.
Sai carregando ele da cama, na sala ele gritou “Olha o desenho que eu fiz!” Peguei a folha, admirei os rabiscos e falei “Meu Deus! Esse garoto será um grande artista!” E em seguida perguntei “E sua irmã onde está?” E o pequeno me respondeu “Deve estar no quarto dormindo ainda”.
Soltei ele na sala e fui lá ver a pequena, estava deitada na cama dormindo tão tranquila... peguei ela nos braços, o casal que sempre quisemos ter, mas a verdade é que não imaginávamos que iam acabar vindo os dois de uma vez só.
Aliás, sempre não, minto.
Quando te conheci nunca imaginei que teria filhos. Eu gritava pra todo mundo que jamais faria isso. Crianças? Dão trabalho demais. Nossa! São um gasto muito grande! Odeio crianças.

Soltei a garotinha dos meus braços, e tudo se passou na minha cabeça.

Despertando do meu devaneio acordado, me encontrei na minha cama sozinho olhando pro teto, e logo percebi que tudo que eu havia sonhado jamais iria se realizar. Mas por que não? O que de impossível havia nessa realidade tão simples.

Você.
Você partiu.

Entrou na minha vida, no meu coração. Mudou meus planos, me mudou. E foi embora. Sem motivo, explicação, sem porquê, você partiu e me deixou aqui só.
Você sempre disse que o meu maior problema era que eu não tinha planos. E bom, era verdade. Viver um dia de cada vez, Carpe Diem era meu lema. Não pensar muito no amanhã ou cinco anos na frente, eu era assim.
Mas é engraçado como as pessoas mudam. De repente, agora tudo que eu mais tenho são planos, para daqui há um mês, ou dois, e até para cinco anos no futuro. Eu agora queria uma família, e sonhava com o casal de filhos que você sempre falava. Eu que quis ter todas as mulheres, de repente, nos meus planos, só havia uma e mais ninguém. Se o problema era que vivíamos em mundos diferentes, de repente, tudo que eu queria era entrar no seu mundo e viver nele, não somente por você, mas sim, porque se tornou realmente o que eu queria.
Eu te perguntei, “Se pudesse mudar algo em mim, o que seria?” E você me disse, “Eu gostaria que você tivesse planos.” E agora tenho planos, todos os planos do mundo. Todos os planos que você sempre quis.
Mas...
Todos os meus planos são com você.
E você partiu.

Um lado de mim sempre fica esperando que você vá voltar. Que você consiga sonhar como eu sonhei, a mesma fantasia que se passou na minha cabeça, nós dois acordando juntos e um casal de filhos pulando por aí uns anos a frente. E que você quisesse tanto quanto eu torná-la realidade. Mas um outro lado meu, sabe que você nunca vai voltar.
O problema é que mesmo que você conseguisse ver o que sonhei, e voltasse para mim, se, ou quando isso acontecesse, pode já ser tarde demais.
Cada dia que passa eu fico mais distante, e dou mais um passo sem volta para longe de você. Hoje eu ainda me pergunto se ainda seria possível, mas amanhã eu talvez nem me pergunte mais. Amanhã provavelmente já vai ser tarde demais.
Você me pediu um tempo para pensar, um tempo sozinha, um tempo para você, um tempo para analisar tudo isso.
E eu resolvi te dar, resolvi me afastar o máximo que consegui, queria ver você melhor, queria que você pensasse mesmo bem no que fazer e tomasse a decisão certa. Mas aí eu fico pensando se eu ainda estarei aqui quando você tomar. Ou se você tomar.
E infelizmente eu acho que não.
Cada dia que passa eu me distancio mais, e a verdade é que já dei tantos passos para longe que nem sei mais se é possível voltar. E eu sei que em breve eu estarei definitivamente longe demais.
Mas enquanto eu amar, eu vou lutar por amor. Como disse Príamo, rei de Troia, “Eu já lutei tantas guerras na minha vida, várias por territórios, outras por poder, algumas por glória. Mas agora, eu acredito que lutar por amor, na verdade, faz mais sentido que todo o resto”.
Eu comecei a escrever esse último desvario na esperança de te falar que o que você queria que eu mudasse, havia mudado, e que agora poderíamos ser felizes juntos. E que se existiam motivos para dúvidas, agora não existiam mais. E que eu ainda queria tanto que você voltasse. Que eu ainda te amava. Que eu iria continuar lutando por amor e que tudo teria valido a pena.
Mas isso tudo foi ontem de manhã.
Agora, já é hoje à noite, eu me pergunto se já não ficou tarde demais.
Na verdade, eu acho que já é tarde demais.

E que esse último desvario por você, na verdade foi uma carta de despedida.

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